Brasília – A Proposta de Emenda à Constituição conhecida como “PEC da Blindagem” chegou ao Senado após aprovação na Câmara e é considerada por especialistas o mais amplo movimento do Congresso contra o conjunto de leis criadas para combater crimes de colarinho branco desde os anos 1980.
O texto determina que, para a abertura de processo criminal contra senadores, deputados federais ou deputados estaduais, o Supremo Tribunal Federal (STF) ou os tribunais competentes deverão solicitar autorização prévia da respectiva Casa legislativa, em votação secreta. A medida também concede foro privilegiado a presidentes de partidos políticos.
Brechas e possíveis impactos
Juristas apontam que a proposta contém lacunas que podem suspender investigações já em curso e criar novas restrições à atuação do Judiciário nas esferas cível, eleitoral e trabalhista quando houver parlamentares envolvidos. Flávia Bahia, professora da FGV Direito Rio, afirma que a emenda “contraria o combate à corrupção e viola o princípio republicano da responsabilização”. Para o advogado Berlinque Cantelmo, o projeto “fragiliza o enfrentamento à corrupção e amplia privilégios à classe política”.
Contexto político
A proposta ganhou força em meio a choques entre Congresso e STF. Parlamentares aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) encabeçam as criticas a ministros da Corte, especialmente Alexandre de Moraes, relator de processos relacionados à tentativa de golpe, e Flávio Dino, responsável por inquéritos sobre emendas parlamentares.
O centrão, que reúne legendas de centro e centro-direita, uniu-se ao PL e a parte da oposição de esquerda para impulsionar a emenda. O relator na Câmara foi o deputado Claudio Cajado (PP-BA). O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), defendeu em plenário que a PEC garante “prerrogativas constitucionais” dos mandatos. Cajado afirmou que não se trata de impunidade: “As prerrogativas fortalecem as instituições e asseguram liberdade de expressão e voto”.
Retomada de regra extinta há 24 anos
Em 2001, dentro do chamado “pacote ético” conduzido pelos então presidentes do Senado, Edison Lobão (MA), e da Câmara, Aécio Neves (MG), o Congresso extinguiu a exigência de licença parlamentar para abertura de processo criminal contra congressistas. A mesma regra, ampliada, volta agora à pauta legislativa.

Imagem: Internet
Desde a redemocratização, sucessivos escândalos – como Coroa-Brastel (1986), Anões do Orçamento (1990), mensalão (2005), sanguessugas (2006) e as manifestações de 2013 – impulsionaram leis como a de Lavagem de Dinheiro (1998), a Ficha Limpa (2010), a Anticorrupção Empresarial (2013) e o instituto da delação premiada. A partir de 2016, porém, o Congresso iniciou uma reação: derrubou as “Dez Medidas contra a Corrupção”, limitou o alcance do Coaf ao barrar sua transferência ao Ministério da Justiça em 2019, aprovou a Lei de Abuso de Autoridade e, em 2021, afrouxou a Lei de Improbidade Administrativa exigindo prova de dolo.
Cobrança por equilíbrio entre poderes
Deputados favoráveis à PEC argumentam que decisões “excessivas” do STF motivaram a proposta. Além de críticas à Lava Jato, lembram julgamentos de 2019 que restringiram o compartilhamento de dados do Coaf e estabeleceram que a prisão só ocorre após o trânsito em julgado.
A PEC agora será analisada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Se aprovada, precisará de 49 votos em dois turnos no plenário para ser promulgada. Não há previsão de data para a votação.
Com informações de Folha de S.Paulo